quinta-feira, 29 de abril de 2010

O Argumento

Busquei a inspiração em lugares inóspitos. Preso no coração de um deserto, tentei fugir andando em círculos, com os pés bêbados. Tentei cavar. Encontrei ossos de antepassados, grãos de areia esquecidos, odores raros.

Encarei as nuvens esperando ter um déjà vu. Encarei as nuvens esperando ter um déjà vu.

Inventei alfabetos para compor poemas apócrifos. Expirei o ar de junho imaginando libertar meus sentidos. Não senti a pancada na nuca, surda.

Prendi entre os dentes galhos que encontrei pelo chão, esperando neles encontrar seiva. Minha boca ensangüentada sentiu o sabor do ferro e regurgitei meu jejum.

Caminhei sobre a ponta dos pés, cuidadoso, para então descobrir um colchão de pregos preso entre a carne e a as unhas. Ri defeito louco.

Amaldiçoei minha inépcia enquanto beijava com calor minha coragem. Descobri uma bússola em meu bolso, sem ponteiros. Nela, busquei as horas.

Rocei meus cabelos na relva verde, sorri para o sol e a lua, desejei mais que tudo estar quedo. Um cão vagabundo se aproximou e lambeu meus lábios, neles encontrou doçura. De pé, entreguei-lhe meu passado como um presente. Recolhi-me à sombra e observei a dança do vento. E foi assim que aprendi.